Fotógrafo | Fevereiro 2014 | Portugal
Há um eles e há um nós. Há um eles, cada uma das vítimas – os torturados, os desaparecidos, os mortos, os familiares e amigos que ficaram –, e um nós, o nós colectivo que tem o dever de conhecer, reconhecer e fazer com que a memória não seja esquecida. O fotógrafo João Pina reuniu em livro – e em exposição – um retrato visual acerca do que foi a Operação Condor, descrita no posfácio pelo juiz espanhol Baltasar Garzón como uma “operação diabólica de alguns serviços secretos, coordenada pela CIA e pelas ditaduras militares latino-americanas e destinada a aniquilar os movimentos de esquerda na região”, durante as décadas de 70 e 80.
Já antes João Pina se tinha proposto fotografar ex-presos políticos portugueses, reunidos também em exposição e em livro, intitulados ‘Por Teu Livre Pensamento’. Aqueles homens e aquelas mulheres olham-nos, deram a sua liberdade por nós, e incomodam-nos ao perguntarem-nos: “e agora? o que estão a fazer com a herança que vos deixámos?”
Além do trabalho de foto-reportagem, que faz para várias publicações como The New York Times, The New Yorker, Stern, El Pais ou Visão, João Pina, a viver em Buenos Aires, dizia-me, ao despedir-se depois de termos feito a entrevista no lugar que já foi o de Natália Correia e das suas tertúlias, que foi escurecendo com o dia, como esboços de uma pintura, que não percebia como é que conseguíamos estar a viver neste país e neste estado de coisas sem irmos para a rua a sério. Só me saiu silêncio, agudizado quando cheguei a casa e li a dedicatória que me tinha escrito no livro Condor: “num momento em que as bandeiras estão sem força, torna-se ainda mais vital pôr as luzes sob as sombras do passado para não esquecer”.